Meus amados e queridos irmãos em Cristo Jesus a Paz do Senhor!
Pareceu-me bem preparar e apresentar um tratado especial sobre o direito e suas raízes históricas.
É um estudo inédito, já que dessa espécie é o primeiro tratado na internet. Serve como base para os pregadores da palavra de Deus e até para os advogados cristãos se aprofundarem os seus conhecimentos nessa área específica. Vamos verificar!
No processo de consolidação do Primeiro Império Babilônico (1800 – 1600 a.C.), observamos a trajetória que permitiu a civilização amorita subjugar uma grande parcela da população encontrada na Mesopotâmia. Entre os diversos reis que empreenderam a formação dessa estrutura política sólida e centralizada, destacamos o papel desempenhado por Hamurábi, monarca que comandou a Babilônia entre os séculos XVIII e XVII a.C..
Buscando garantir o exercício de seu poder no rico território mesopotâmico, esse monarca decidiu empreender uma reforma jurídica que fixou uma série de importantes transformações. Até o seu governo, as leis que regulamentavam os direitos e deveres dos babilônicos eram transmitidas por meio da oralidade. Ou seja, toda a lei que partia da autoridade real ou traçava as tradições jurídicas da população era repassada de boca em boca.
Muitas vezes, esse tipo de costume abria espaço para diversas contendas e modificações que poderiam ameaçar a estabilidade necessária a um regime controlado por um único indivíduo. Por isso, o rei Hamurábi ordenou a criação de um código de leis composto por aproximadamente 280 artigos devidamente registrados em um imenso monólito, que levava em seu topo um relevo com a imagem do próprio rei. Dessa forma, nascia um dos mais antigos códices de leis escrito em toda história humana.
Em linhas gerais, o Código de Hamurábi foi baseado na anterior Lei de Talião, que preconizava o princípio do “olho por olho, dente por dente”. Dessa forma, podemos perceber que, em diversos casos, as leis escritas por Hamurábi privilegiavam a adoção de uma pena similar ao tipo de crime realizado pelo seu infrator. No entanto, quando estavam envolvidos indivíduos originários de classes sociais distintas, essas penas poderiam ser bastante variadas.
Preocupado com a aplicação das leis em todo território dominado, Hamurábi teve o cuidado de produzir cópias do código que deveriam ser fixadas em diferentes regiões de seu império. Dessa forma, estabelecia um meio de homogeneizar as decisões jurídicas a serem adotadas e, ao mesmo tempo, garantia meios de legitimar sua própria autoridade. Mesmo com o fim do Império Babilônico, percebemos que diversas civilizações se inspiraram nesse importante legado jurídico para organizar seu próprio conjunto de leis.
CÓDIGO DE HAMURABI (RESUMO)
Quais são os assuntos abrangidos pelo Código Hamurabi e em que âmbito se pode dizer que o Código de Hamurabi foi pioneiro?
R: Os assuntos abrangidos pelo Código Hamurabi são, resumidamente segundo pesquisa de Renata Malta Vilasboas (Revista Prática Jurídica, Ano V – Nº 52 – 31 de julho de 2006):
Artigo 1º ao Art. 5º: Previsão das penalidades para alguns delitos;
Artigo 6º ao Art. 126: Referem-se ao patrimônio;
Artigo 127 ao Art. 195: Referem-se à Família e Sucessão;
Artigo 196 ao Art. 214: Referem-se à Pena de Talião;
Artigo 215 ao Art. 240: Referem-se aos direitos e obrigações de determinadas classes;
Artigo 241 ao Art. 277: Referem-se a Preços e Salários;
Artigo 278 ao Art. 282: Referem-se a normas complementares acerca da propriedade de escravos.
As penas impostas pelo Código Hamurabi eram severas e extremadas, e geralmente culminavam em mutilações. Essas penas eram divididas em duas espécies:
a) as pecuniárias que determinavam o pagamento de quantia determinada de acordo com a gravidade e o tipo do delito praticado.
b) Pena de Talião, a chamada “olho por olho, dente por dente”. Era uma idéia de equivalência entre o dano causado e a pena recebida ( Op. cit. pp. 34/35).
O Código de Hamurabi trazia no seu preâmbulo, uma evocação aos deuses.
Inicia com a apresentação da base de qualquer justiça: “se alguém acusa um outro, mas não pode prová-lo, o acusador será morto.” E “se alguém testemunha contra o acusado sem poder provar o que diz e só o acusado for condenado à morte, a testemunha perderá a vida”. Até o juiz que proferir uma sentença errada será “publicamente expulso de sua cadeira.”
O roubo de escravo era punido com a morte, uma vez que o escravo era a única força que movimentava a economia do império. Se um escravo diz a seu senhor “Não sou seu escravo.” , terá a orelha cortada. E ficará livre. Só poderá salvar a orelha sem perder a liberdade se conseguir comprá-la – para o que os templos possuíam fundos especiais.
O Estado era todo poderoso, visto que o próprio imperador “recebia” seu poder dos deuses. Mas tinha várias obrigações, dentre as quais: “se um ladrão rouba e não é preso, o que foi roubado deve expor, diante dos deuses, tudo o que perdeu, e a cidade ou o governador da região que habita deverá reembolsá-lo pelos bens perdidos.”
A responsabilidade de todos pelos atos cometidos individualmente, parece ter sido a base constituída da sociedade da época. “Se um arquiteto constrói para alguém uma casa e não o faz solidamente, provocando um desmoronamento devido a defeito de seu trabalho e causando a morte do proprietário, o arquiteto deve ser punido com a morte.” Mas se o acidente matar o filho do proprietário, é o filho do arquiteto que pagará com a sua vida.
O Código também trazia no seu bojo no tocante aos conceitos da moral e da família, norma proibitiva da venda da casa, do campo e do horto (bens de família) pelo cabeça da família. “Se alguém negligenciar no seu trabalho a conservação do seu dique e nele se forma uma brecha, provocando inundação das terras dos outros, este homem deverá dar em reparação o trigo que por causa dele os outros perderam.”
O Código continha normas sobre o salário mínimo. “Se alguém aluga um lavrador, deverá pagar-lhe anualmente oito gur de trigo.” E “se alguém aluga um agricultor mercenário, deverá dar-lhe seis se por dia.” Mas “se um homem é encarregado de cultivar um campo e não semeia nele trigo, deve fornecer ao proprietário do campo tanto trigo quanto tenha colhido o vizinho.”
As difamações eram normatizadas num capitulo inteiro. As penas contra os caluniadores eram graves, prova disto é vista no artigo 127: “Se alguém difama uma mulher… e não o pode provar, deverá ser arrastado perante o juiz para lhe marcar com ferro a face.” Na época, a mulher era bastante respeitada. A esposa não podia ser repudiada mandando-a embora, futilmente. A mulher deveria receber uma garantia de sustento sob forma de “donativo de repúdio.” A esposa enferma, também não podia ser repudiada. “Se alguém toma uma mulher e esta é colhida pela moléstia, se ele então pensa em tomar outra, não deverá repudiar a mulher presa de moléstia, mas deverá conservá-la na casa e sustentá-la enquanto viver.”
O Código protegia o menor e instituía a lei do ventre livre. A adoção da criança era irrevogável. “Se o membro de uma corporação para criar um menino e não lhe ensina seu ofício, o adotado pode voltar para a casa paterna.” Todavia “se ele lhe ensina o ofício, o adotado não pode ser mais reclamado.” Caso o próprio pai “quer renegar o adotado, o filho adotado não deverá ir embora.” Antes, “deverá receber do patrimônio do pai um terço e do filho não adotivo um terço, e então ele deverá afastar-se.” Isso obrigava o pai ingrato a pensar melhor antes de qualquer tomada de decisão.
Entretanto “se um filho espanca seu pai, ser-lhe-ão decepadas as mãos.”
Para dar ênfase às leis que promulgava, Hamurabi terminava o Código da seguinte forma: “Que cada oprimido apareça diante de mim como rei que sou de justiça. Possa ele folgar o coração, exclamando: Hamurabi é um pai para seu povo. Estabeleceu a prosperidade para sempre e deu um governo justo a seu povo. Por todo o tempo futuro, o rei que estiver no trono observará as palavras que eu tracei neste monumento.” ( Cf. Novo Conhecer Abril Cultural, V. II, pp. 154/6).
Quanto à segunda parte da pergunta sobre em que âmbito se pode dizer que o Código Hamurabi foi pioneiro? O dicionarista Marcus Cláudio Acquaviva, diz que: “(…) Embora a consolidação de Hamurabi não seja o documento legal reformador mais antigo até hoje conhecido – antes dele os reis Ur – Nammu (cerca de 2.050 – 2.032 a. C.) , Lipit-Ishtar (1.875 – 1.865 a. C.), e Urukagina, de Lagash – já haviam feito reformas legislativas – é de se notar que, mil anos após sua elaboração, ainda era aplicado integralmente na Babilônia e na Assíria!” (Cf. Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva).
II. A origem do direito Romano
Direito Romano é o nome que se dá ao conjunto de princípios, preceitos e leis utilizados na antiguidade pela sociedade de Roma e seus domínios.
A aplicação do Direito romano vai desde a fundação da cidade de Roma em 753 a.C. até a morte do imperador do Oriente Justiniano, em 565 da nossa era. Neste longo período, o corpo jurídico romano constituiu-se em um dos mais importantes sistemas jurídicos criados desde sempre, influenciando diversas culturas em tempos diferentes..
Em sua longa história, podemos assinalar as seguintes fases como capitais no desenvolvimento e aperfeiçoamento do Direito Romano (de acordo com sua organização estatal):
Período que vai desde a fundação da cidade de Roma (753 a.C.) até a República (510 a.C.), onde predominava um direito baseado no costume (mores), tendo o Direito Sagrado ligado ao humano.
Período que vai desde 510 a.C. até o período imperial com Augusto, em 27 a.C. A fase seguinte do Direito Romano ocorre no período imperial, com o primeiro monarca, Augusto, onde prevalecia o jus gentium sobrerssaindo sobre o jus fas (Direito Sagrado, religioso), direito comum a todos os povos do Mediterrâneo, bem como o conceito do bonum et aequum, e o conceito da boa fé;
Período do Direito clássico, época áurea da jurisprudência, que vai do reinado de Augusto até o imperador Diocleciano. Há uma participação maior dos jurisconsultos, os conhecedores do Direito à época, além da substituição do direito magistratural (jus honorarium) que auxiliava, e supria o cerne originário do Direito Quiritário; no lugar deste surge o cognitio extra ordinem, administração da justiça de aplicação particular do imperador.
Período da Monarquia Absoluta
Período após o imperador Diocleciano (século IV d.C.), até a morte do imperador Justiniano. É neste período que surge o direito pós-clássico, havendo a ausência de grandes jurisconsultos, ocorrendo uma adaptação das leis em face à nova religião predominante, o Cristianismo. É neste período que ocorre a formação do direito moderno, que começa a ser codificado a partir do século VI d.C. pelo imperador Justiniano.
Segundo a concepção romana direito era natural, conforme a realidade e não produto de concepções intelectuais e abstratas. Sua base era a vida social, concreta, conjunto de fenômenos e de circunstâncias políticas, econômicas e sociais, da qual emergia como conjunto de soluções normativas para os problemas que essa mesma vida suscitava no conjunto dos interesses subjetivos.
Era também um direito que conjugava a tradição como o progresso, não sendo estático mas, como a vida, um processo in fieri: era um direito concreto, porque as suas instituições como resposta a exigências e práticas da vida: era um direito universal, porque Roma era, em certo período da história dos povos, um verdadeiro universo, por sua importância e extensão: e, finalmente, era um direito que visava proteger e realizar, em toda a sua dimensão, o valor da liberdade individual.
O ensino do Direito romano busca tornar o jurista capaz de:
a) Uma certa liberdade e uma relativa independência perante a Lei, porque desmistifica o pensamento positivista do Direito que, identificando Lei e Direito, monopoliza a lei como fonte própria. Por isso torna-se incorreto dizer que o Direto possui uma natureza criadora e interpretativa da lei de modo a julgar e não aceitar leis injustas. O direito não se restringe a leis, ele é muito mais amplo, pois baseia-se na ética moral, costumes, experiência, história, conflito de interesses e demais conceitos que o tornam uma rica ciência.
b) O jurista também deve interpretar e aplicar as normas jurídicas, mas saber, também, criar a norma adequada à especificidade de cada situação e elaborar a construção jurídica aplicável ao caso. Combater o silogismo judiciário, mais empenhado em afirmar uma certa ciência do que em servir à vida, esquecendo que nem tudo que é lógico é justo e que sempre há, dependendo do quanto o jurista se empenha para resolver o problema uma solução para cada caso em particular.
c) Uma firmeza de princípios perante as transformações da vida jurídica atual, que atravessa uma crise muito semelhante à que sofreu o mundo romano: as novas idéias não receberam uma consagração jurídica apressada, antes, foram devidamente testadas através de uma aplicação cautelosa e prudente. Isso se observa hoje em dia também.
O Direito romano conseguiu se consagrar por conseguir interpretar e atualizar as leis de forma a atender as necessidades do cotidiano romano. Como parte do mérito dos romanos o rigor inexcedível, as figuras jurídicas: formularam princípios doutrinais e regras jurídicas: consagraram uma terminologia que perduraram por muitos séculos. Por isso e por outros motivos o estudo do Direito romano é fundamental até porque muitas das instituições jurídicas romanas foram transcritas ou adaptadas para os dias de hoje.
O Direito romano assumiu elevada importância para o estudo devido ao seu valor normativo, a sua perfeição técnico-jurídica, o seu valor prático e histórico e a sua utilidade para o Direito comparado. Por ser um produto histórico de nossa sociedade sofreu diversas alterações no seu processo de evolução, adaptando-se às circunstâncias de tempo e de espaço.
Os romanos partiam dos problemas, dos casos concretos, para, raciocinando indutivamente, construir as soluções normativas adequadas ao seu caso. O Direito romano tem ,portanto, elevado valor formativo para dar base e aos juristas contemporâneos encontrar o rigor prático necessário para o conhecimento e a solução dos problemas jurídicos.
Nos primeiros séculos de Roma, O Direito era agregado à religião, não havendo distinção. Por isso o Sacerdote tinha poderes religiosos (Direito sagrado) e jurídicos (Direito civil) e estes deveriam pertencer a classe superior (patrícios). O Direito privado, então, teve seu berço no colégio dos pontífices ou sacerdotes de elevada posição social. Os diversos tipos de Direito existentes, dentre eles, o Direito público, o privado e o sacro eram cultivados pelos patrícios.
Nos primeiros séculos os interesses dos patrícios vigoravam representados pelos sacerdotes, magistrados e senadores. A partir do séc. V a.C. com as reivindicações e os protestos dos plebeus a situação se modifica desenvolvendo-se e consolidando-se as chamadas Magistraturas e assembléias populares. O marco do surgimento do Direito laico é a chamada lei das XII Tábuas com clara participação popular.
O Direito romano se formou gradativamente com normas estabelecidas em costumes, leis, decisões dos juízes e com obras dos juristas. O Direito romano se dividia em várias ordens ou estratos normativos, diferenciados pelo âmbito de aplicação, como o ius civile (costumes e leis), aplicável apenas aos cidadãos romanos, o ius gentium, aplicável a todos os homens sem distinção de nacionalidade. Existia ainda o ius pretorium criado pelos pretores , par reforçar, suprir ou corrigir o ius civile.
O Direito romano se dividiu em diversas fases históricas que marcaram mudanças políticas e jurídicas em Roma.
Se divide basicamente em quatro partes:
1) a Monarquia ou Realeza
2) a República
3) o Principado
4) o Dominado.
A Monarquia, fase que se estendeu de 753 a.C a 510 a.C o poder político era exercido pelo rei, pelo senado e pelo povo(através de comícios). O rei era o Sumo sacerdote, chefe de exército, juiz supremo; seu cargo era vitalício mas não hereditário, podendo , todavia, indicar seu sucessor. O senado era uma assembléia aristocrática, formada pelos patrícios. O povo era a sociedade romana, constituída de patrícios e plebeus, exercendo seus direitos em assembléias denominados comícios. No início só os patrícios tinham todos os direitos, mas depois os plebeus conquistaram os demais direitos(através da Lei das XII Tábuas).
Durante a República(de 510 a.C a 27 a.C) os órgãos fundamentais do Estado eram a magistratura, o senado e o povo. Os Magistrados eram os detentores do poder de soberania, compreendendo os censores, os cônsules, os pretores e os questores.
Os magistrados tinham, como poderes, a potestas, o imperium e a iurisdictio. A potestas era o poder de representar o populus romanus; o imperium era o poder de soberania, contendo as faculdades de comandar os exércitos, de convocar o senado e as assembléias populares, e de administrar a justiça.
O imperium era próprio dos cônsules, dos pretores e, acidentalmente, do ditador, magistrado excepcional, criado quando o ordenamento civil era suspenso por força de calamidade pública, crise política interna ou extema.
A iurisdictio era o poder específico de administrar a justiça; competia preferencialmente aos pretores e, secundariamente, aos questores e edis curuis. O pretor era o magistrado encarregado de administrar a justiça. O senado era o órgão político da República que reunia a aristocracia econômica e cultural. As suas decisões eram verdadeiras ordens, mas sua principal função era legitimar e validar as leis aprovadas nos comícios. Havia também ainda as assembléias da plebe que elegiam os tribunos da plebe e votavam os plebiscitos, leis inicialmente reservadas a plebe.
Na fase do Principado( de 27 a.C a 284 a.C ) diversos conflitos entre as classes sociais e revoltas de escravos provocaram uma sensível alteração política em Roma. Neste período vigoravam ainda estruturas republicanas existentes, no entanto o poder absoluto que constitui um império encontrava-se presente. As instituições de poder eram o princeps, o senado e o povo. O princeps possuía parte do poder de cada um dos anteriores unido ao poder do imperium.
Logo depois e por último vem o Dominado( de 284 a.C a 565 a.C) que é uma fase marcada pelo absolutismo. Diversos fatores internos e externos propiciaram a instauração do Dominado, promovida por Diocleciano. Ele divide o império romano em Império Romano do Ocidente(Roma) e o Império Romano do oriente(Constantinopla).Todos os poderes e órgãos públicos passaram, portanto, a se submeterem à vontade do imperador. No campo do direito passa por uma fase de vulgarização e corrupção do Direito romano clássico, por influência dos demais povos que foram dominados pelos romanos.
No que se refere ao direito privado, existem três períodos fundamentais na formação do Direito privado romano. O Período Arcaico corresponde à sociedade patriarcal das origens que vai até o século IV a.C. Nesse período, a posse de terra cabe a uma única classe e a produção é destinada ao uso familiar. O Direito tem suas fontes nos costumes e na lei predominando o formalismo nos atos e no processo jurídico e com clara influência religiosa. A família ocupa posição central na sociedade e domina o direito privado.
O período da escravidão (III a.C à metade de III d.C) é o período em que surge e começa decair o chamado modo de produção escravista.è a fase de expansão imperialista e de muitas outras mudanças no campo comercial e econômico. No direito privado predomina a criação pretoriana e as obras finas dos juristas. E por fim, o período de decadência( que vai da metade do século III d.C à queda do império) ocorrida pela crise econômica e o surgimento de forças de trabalho, novas relações comercias e novas relações campo e cidade.
O Direito privado desenvolve-se com o surgimento de novos institutos, consolidando-se através da obra de Justiniano. Do ponto de vista jurídico também se divide em quatro épocas. A Época arcaica( 753 a 130 a.C)Houve o predomínio do ius civile
É importante notar que para o melhor entendimento do Direito Romano fez-se crucial a obra de jurisconsultos como Pompônio, Paulus, Upianus, Justinianus. Há também escritos dos gramáticos como Flaccus, Valerius Probus, Nonius Marcellus, entre outros, cujas obras foram importantes para a compreensão do que era o Direito na época da Roma antiga.
O Juiz, na sua essência, é uma figura criada, desde dos primórdios da civilização, notadamente, no imaginário dos povos, que entregavam as suas vidas e suas decisões a terceiros, a quem compreendiam possuírem, mais freqüentemente por uma escolha divina, o poder de vislumbrar o melhor caminho ou solução. Também se configurou nos conselhos dos mais antigos, onde se reuniam os anciãos nas suas respectivas comunidades, quando eram chamados a decidir sobre determinadas questões de interesse coletivo, na maioria dos casos. Se não do interesse coletivo objetivamente, tratavam de um interesse individual que repercutiria como modelo ou expiação para os demais da coletividade. Assim, gradativamente, foram se estabelecendo normas de conduta e de convivência que foram norteando o direito de cada um e do grupo comunitário.
A partir da sistematização, mesmo que precária, dos normativos de convivência, através dos legisladores ou conselheiros, paulatinamente, surgiu a necessidade de estruturar de forma organizada o papel do Juiz.
A primeira questão a ser enfrentada para que a figura do Juiz que hoje conhecemos no Brasil se ajustasse a uma forma democrática de atuação, foi a separação da sua atividade julgadora da tutela do
Poder Executivo. Isto quer dizer que, ao longo da história da humanidade houve a constante interferência do Estado Governante/ Poder Executivo na atuação do Juiz,
Magistrado ou Julgador. Mesmo hoje no Brasil, quando o Judiciário através de seus Ministros Juízes, autoriza uma extradição, é preciso que haja a interferência do Executivo, na efetiva realização da medida.
Desde de outras épocas, quando os Reis, os Imperadores e outros déspotas traziam para si o poder de julgar seus súditos, como atualmente nas teocracias e nos regimes ditatoriais, a figura do Juiz foi manchada, porque não manteve a necessária imparcialidade daquele que tem o papel importante de decidir a vida do outro. Temos vários exemplos históricos em que o próprio Governante julgava pessoalmente sobre diversos assuntos: O julgamento de Cristo por Pilatos e Herodes, a cisão entre a Igreja Católica e a Igreja da Inglaterra decidida pelo próprio Rei Henrique VIII, bem como a condenação de suas esposas.
Hoje ainda, nas proclamadas democracias como a dos Estados Unidos da América, algumas medidas como a comutação pena de morte de um determinado cidadão, pode ser modificada com a atuação do Governador de Estado daquele país.
Destacando que um predicado fundamental para àquele que se encontra investido na condição de Juiz é a imparcialidade, exatamente para evitar que haja análise subjetiva e pessoal quando do julgamento de qualquer causa, não se deve acumular a função de Poder Executivo e Judiciário, sob pena de ferir a imparcialidade tão necessária num julgamento mais justo. Isto porque o próprio Poder Executivo pode possuir um interesse sobre determinada demanda ou litígio.
Nesse sentido, o Código de Processo Civil Brasileiro, Lei preponderante que regula as normas e procedimentos processuais, indica que o Judiciário é um Poder que depende da provocação para que atue na sua função de dizer o direito. Assim está previsto: “Art. 2o Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais.” Quando se fala de tutela jurisdicional se diz exatamente da função do Judiciário, através do Juiz, de atuar no julgamento dos pedidos e requerimentos feitos pelos interessados.
O Juiz, na sua atividade, não pode decidir contra o que estiver disposto em lei, sempre levando em consideração a hierarquia das leis brasileiras, em cujo mais alto patamar está a Constituição, sob a qual todas as leis devem estar em consonância. Aquele que inicialmente postula ao Juiz se denomina “Autor” e a pessoa que é chamada a se defender , será denominada “Réu” no litígio que for apresentado em Juízo.
A partir da provocação ou do pedido formulado, dentro dos critérios e instrumentos previstos em lei, e por intermédio de advogado constituído para tanto, o Juiz dirigirá o processo, dentro dos limitadores e normativos do Código de Processo Civil: “ Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe: I – assegurar às partes igualdade de tratamento; II – velar pela rápida solução do litígio; III – prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça; IV – tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.”
De acordo com o disciplinado em lei decidirá o conflito nos limites em que foi proposto, sendo proibido ao Juiz conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte. Ele apreciará livremente a prova, possuindo toda autonomia de acordo com a lei, e atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.
Visto que a principal qualidade que se deseja de um Juiz é a sua imparcialidade, exatamente para evitar a defesa de interesse pessoal, existem algumas situações nas quais o Juiz não pode atuar, sendo para tanto impedido por Lei: I – de que for parte; II – em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do
Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha; III – que conheceu em primeiro grau de jurisdição, tendo-lhe proferido sentença ou decisão; IV – quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau; V – quando cônjuge, parente, consangüíneo ou afim, de alguma das partes, em linha reta ou, na colateral, até o terceiro grau; VI – quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa.
Também não poderá o Juiz atuar em conflitos, em relação a sua pessoa, quando verificadas quaisquer das condições à seguir: I – amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes; II – alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu cônjuge ou de parentes destes, em linha reta ou na colateral até o terceiro grau; III – herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de alguma das partes; IV – receber dádivas antes ou depois de iniciado o processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou subministrar meios para atender às despesas do litígio; V – interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.
III. As raízes históricas do direito no Brasil
No Brasil, todos os julgadores devem ser Juízes previamente nomeados, não se admitindo tribunais de exceção ou de formação ocasional. Os Tribunais do Brasil são de nível estadual, regional ou de abrangência nacional. Os Juízes que compõem esses Tribunais podem ter denominações diferenciadas, entretanto, na essência, são Juízes porque julgadores dos litígios colocados à sua apreciação. Assim, podemos classificar os Juízes de primeira, segunda e terceira instâncias, da seguinte forma, respectivamente: Juízes,
Desembargadores e Ministros.
Na primeira instância, existem os Juízes Estaduais, os Juízes Federais e os Juízes Militares. Na segunda atuam os denominados Desembargadores Estaduais, Desembargadores Federais que atuam nos Tribunais Regionais Federais e os Desembargadores dos Tribunais Regionais do Trabalho. No último nível de instância se encontram os Juízes denominados Ministros, que empossados exercem suas funções nos seguintes órgãos: Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho, Superior Tribunal Militar e
Tribunal Superior Eleitoral.
Recentemente surgiu a figura do Juiz Leigo, que já está sendo posta em prática no Rio de Janeiro. Tais Juízes são auxiliares dos Juízes efetivos de 1ª. Instância nos
Juizados Especiais, possuindo limitações na sua atuação, apesar da exigência de nomeação por concurso público, com prática forense necessária.
Ressalte-se ainda que, 80%(oitenta por cento) dos Desembargadores, em todo país, são nomeados a partir de sua própria promoção por antiguidade e/ou merecimento, da condição anterior de Juiz de carreira, de acordo com a LOMAN, Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar 35 de 14.03.1979). Entretanto, um quinto, isto é, 20% (vinte por cento), são nomeados conforme previsto na Constituição, entre advogados indicados pela
OAB e membros do “Ministério Público” (Promotores ou Procuradores). Quanto aos Ministros dos Tribunais Superiores, são todos nomeados pelo Presidente da República, desde que preencham os requisitos de notável saber jurídico e reputação ilibada, sendo necessária prévia aprovação do Congresso Nacional, antes da investidura no cargo.
Após o ingresso na magistratura, até para evitar pressões externas, o Juiz adquire estabilidade, se torna inamovível e vitalício no cargo quando transcorridos 2 (dois) anos de efetivo exercício. No entanto, tal como os demais servidores a aposentadoria compulsória ocorre aos 70(setenta) anos de idade.
Academia, História e Direito
A formação do pensamento jurídico brasileiro
Resumo: O presente artigo tem como objetivo a análise da origem do pensamento jurídico do Brasil, a partir do surgimento das primeiras Universidades de Direito e do fenômeno conhecido como bacharelismo que ocorreu durante o império brasileiro. Para melhor compreender toda essa gama de fatores, será feito uma contextualização histórica do momento do surgimento dessas instituições de ensino superior. Há a necessidade de compreender os interesses e ideologias da época. Após este momento, serão abordadas as características, as finalidades e os problemas dessas instituições que desembocam no fenômeno do bacharelismo.
Palavras-chave: Bacharelismo. História. Faculdade. Direito. Brasil. Pensamento. Formação. Identidade. Surgimento.
1. Contextualização histórica
Em 1822, o Brasil conquista sua emancipação política de Portugal com algumas peculiaridades com relação aos seus vizinhos hispânicos. A primeira se deve ao .fato de todo o processo ter sido realizado de maneira consideravelmente pacífica, enquanto em toda a América Espanhola, a independência foi conquistada de forma sangrenta e violenta. A segunda peculiaridade, mais interessante para o âmbito histórico-político brasileiro, foi o fato de o Brasil ter proclamado independência, porém ter permanecido com a forma de governo monárquica, ou seja, ainda impregnado de valores e costumes da metrópole.
Com essa nova conjuntura política, formaram-se dois grupos ideológicos que dominavam o cenário político brasileiro: o grupo de tendência conservadora e o grupo de tendência liberal moderada. O interessante dessa divisão é que, na realidade, ela era muito mais sutil do que parecia ser. Em seu interior, os grupos políticos não divergiam, de fato, de princípios ideológicos, mas do modo como esses princípios se consolidariam e se manifestariam na sociedade brasileira.
Tanto liberais moderados como conservadores se encontravam a favor da escravidão, estavam preparados para manter o distanciamento entre liberalismo e democracia e priorizavam o valor da liberdade ao da igualdade. Isso porque ambos os grupos se formavam no interior da elite social, caracterizada pelo agronegócio exportador e escravagista. A diferença real entre os grupos se fundamentava, então, em ver como a monarquia deveria difundir seu poder, de forma mais centralizada e intervencionista (conservadores) e de forma mais descentralizada e limitada (liberais moderados).
O liberalismo exerceu um grande papel durante a consolidação do império brasileiro. A fonte desse liberalismo era européia, já que o conhecimento difundido no Brasil, até então, era europeu em sua totalidade. As elites enviavam seus filhos para se instruírem em cidades portuguesas como Coimbra, logo, estes regressavam, para seu país de origem, impregnados de ideais de cunho liberal europeu. Além disso, toda essa geração de estudantes coimbrãs corria para o exercício de atividades públicas depois de terminadas suas formações acadêmicas.
A força do liberalismo brasileiro se dava principalmente pelo fato do Brasil estar às margens de um processo capitalista que concentrava suas riquezas em países centrais como os europeus. Para acompanhar esse processo, a agricultura voltada para a exportação, como atividade econômica predominante no país, era bastante incentivada pelo governo central e por pressões das elites agrárias. Logo, os ideais liberais tomaram conta do cenário político brasileiro, representando os interesses de uma oligarquia social.
Pactos na compra e venda romana
Evolução dos direitos fundamentais
Comunicação de prisão ao juiz competente
Tribunal de Nuremberg: caráter de exceção e princípio da legalidade
Ditadura de 1964-1985 e responsabilização criminal dos agentes públicos
Porém, esse liberalismo brasileiro era demasiado paradoxal. A elite social, que por integrar a esmagadora maioria dos cargos públicos, se confundia com a elite política, causando uma crise de representatividade, já que esta defendia interesses particulares em detrimento de interesses nacionais. Esta mesma elite política desejava que o governo controlasse os ímpetos populares, extinguindo a democracia e a participação popular, porém também desejava que o imperador não interferisse na economia.
Ao mesmo tempo em que o imperador desejava ampliar seus poderes, se via amarrado à dependência da economia agrária que necessitava de certa liberdade para os latifundiários para se perpetuar. Além disso, havia a necessidade de conciliar os ideais escravagistas com os ideais liberais que eram um tanto contraditórios. Toda essa contradição somente foi possível com o conservadorismo liberal, que se afastava dos radicalismos e permitia a liberdade econômica, mas afastava qualquer tipo ideal democrático e participação popular.
O estudioso do fenômeno do Bacharelismo no Brasil, Antonio Carlos Wolkmer, explica de forma clara a controvérsia liberal que se formava no Brasil:
Ao conferir as bases ideológicas para a transposição do status colonial, o liberalismo não só se tornou componente indispensável na vida cultural brasileira durante o império, como também na projeção das bases essenciais de organização do estado e de integração da sociedade nacional. Entretanto, o projeto liberal que se impôs expressaria a vitória dos conservadores sobre os radicais, estando dissociado de práticas democráticas e excluindo grande parte das aspirações dos setores rurais e urbanos populares, e movia-se convivendo e ajustando-se com procedimentos burocrático-centralizadores inerentes à dominação patrimonial. Trata-se da complexa e ambígua conciliação entre patrimonialismo e liberalismo, resultando numa estratégia liberal-conservadora que, de um lado, permitia o “favor”, o clientelismo e a cooptação; de outro, introduziria uma cultura jurídico-institucional marcadamente formalista, retórica e ornamental.
2. Surgimento das Faculdades de Direito e o Bacharelismo
O surgimento das primeiras Faculdades de Direito no Brasil, em 1827, em Olinda e na cidade de São Paulo, foi um fenômeno extremamente controverso e polêmico. A pauta surge na assembléia constituinte de 1823, logo após a emancipação política brasileira. A polêmica se dá não pela dúvida da necessidade de criação das Faculdades, mas sim pelo local onde seriam fundadas e pelo conteúdo que seria ministrado, já que os constituintes possuíam interesses regionalistas diversos.
A decisão de criar as instituições de ensino superior era predominantemente um projeto da elite. Além de evitar a necessidade de se enviar seus filhos para estudar em Portugal, as instituições teriam a função de promover a autonomia do Estado brasileiro, tornando legítimos os funcionários da ex-colônia.
O acesso às universidades era restrito à elite por diversos motivos. Além das instituições cobrarem uma taxa de anuidade, os estudantes que não tinham origem paulista ou pernambucana tinham de possuir recursos para se manter nessas cidades durante o período do bacharelato, o que já era um tipo de seleção prévia para o ingresso no ensino superior. Além disso, para ser aceito, o aluno deveria possuir conhecimentos em português, latim, francês, inglês, alemão e italiano (após a reforma do ensino livre), o que, naturalmente, selecionava apenas os candidatos que possuíam condições de estudar e se preparar para a prova de ingresso.
Os reais objetivos das instituições de ensino superior estariam mesclados com uma gama de interesses oligárquicos circundava a formação acadêmica dos bacharéis. O grande potencial das Universidades era o de ser um espaço para a homogeneização ideológica, de treinamento da elite. Defendendo seus interesses de se firmarem e continuarem no poder, as elites eram educadas dentro da academia para se ingressarem no serviço público após se tornaram bacharéis.
Os conflitos intra-elite e inter-classe tinham de ser evitados. A homogeneização ideológica vinha nesse sentido, de procurar harmonizar os conflitos econômicos, regionais e culturais da própria elite e entre a elite e o resto da população. Porém, mesmo com a tentativa de promover a homogeneidade em torno de um mesmo arcabouço ideológico, a harmonia não era alcançada plenamente, uma vez que havia uma intensa competição, entre os diversos ramos da elite, pelo domínio do poder.
O que ocorria com maior frequência nas instituições de ensino superior era a criação de um espaço pouco crítico, de reprodução de um conhecimento escolhido. Com a criação dos cursos jurídicos, o conteúdo a ser repassado aos alunos era fruto de uma deliberação consciente da oligarquia, que possuía o objetivo de representar seus próprios interesses. Esse tipo de conteúdo vinha com a missão de moldar-se às especificidades brasileiras e aos grupos econômicos e políticos detentores de poder, com o objetivo primordial de dar uma aparência de legitimidade à ordem e de segregar qualquer valor democrático.
A real função de um bacharel em direito seria a de formar uma massa preparada para satisfazer as necessidades de funcionamento estatais. Estes mesmos bacharéis sairiam da academia e ingressariam no serviço público com um suporte ideológico que, logicamente, estava de acordo com os interesses da elite dominante. A ideia de se formar um corpo de elitistas que estivessem aptos a operar a máquina estatal foi, de fato, um projeto destinado a atender as prioridades políticas, econômicas e ideológicas das classes dominantes e detentoras de poder, sendo fundado nos mesmos ideais liberais contraditórios já mencionados anteriormente. Eduardo Bittar escreve sobre esse fenômeno:
A burocracia estatal demandava profissionais e desejava tê-los preparados dentro de uma cultura ideologicamente controlada, cujas origens fossem seguramente determinadas, e cujas inspirações fossem necessariamente coniventes e proporcionais à docilidade esperada do bacharel em Direito.
A carta de bacharel detinha um poder de status enorme durante o império. Por conta do grande desprezo que se tinha pelos trabalhos manuais – tidos como de cunho escravo – o título de bacharel vinha para qualificar seu detentor e dar uma aura de importância. O caráter individual das profissões liberais, fruto da propagação do liberalismo na época, seduzia as pessoas que se apegavam aos valores da personalidade em si. Além da tradição liberal, Sérgio Buarque de Holanda ressalta que se trata também de uma tradição advinda da metrópole:
Em quase todas as épocas da história portuguesa, uma carta de bacharel valeu quase tanto quanto uma carta de recomendação nas pretensões a altos cargos públicos.
O fenômeno do treinamento elitista era, na realidade, um ciclo vicioso. Os bacharéis vislumbravam no emprego público uma estabilidade econômica agradável, além de ser o ambiente perfeito para guiar a política de acordo com seus interesses, ou seja, o Estado era o grande empregador dessa classe no período do império. Ao mesmo tempo, o governo central via com maus olhos a situação de desemprego dos bacharéis, uma vez que estes formavam uma camada social mais qualificada para maquinar queixas em termos políticos e se aliar à oposição, servindo de instrumento para estes.
A promulgação da lei que instituía a criação dos cursos de ciências jurídicas e sociais, de Olinda e de São Paulo, não previa os demais problemas que iriam surgir e se perpetuar na academia brasileira dali em diante. O primeiro deles estava concentrado no corpo docente, o segundo nos próprios alunos, o terceiro na intervenção estatal e o quarto nas aprovações sem mérito.
A primeira geração dos docentes que ministravam nas recém-criadas Universidades era de procedência coimbrã, ou seja, todo o conhecimento difundido era diretamente vindo de Portugal. O que ocorria prioritariamente era que a profissão acadêmica não era vista como algo principal na vida dos bacharéis e juristas. Geralmente, estes possuíam cargos como de magistrados ou advogados e em segundo plano, lecionavam. Isso gerava uma falta de interesse pela carreira e a maior consequência desse fenômeno era a falta de produção intelectual nacional.
Além disso, a contratação de docentes era feita por critérios distorcidos. Como escreveu Sérgio Adorno:
Efetivamente, virtudes oratórias, prodigiosa capacidade de memorização, qualidades carismáticas, presença na vida pública, atitudes morais prevaleciam no julgamento sobre a capacidade intelectual do candidato ou sobre sua capacidade como docente.
Somando-se aos critérios distorcidos, muitos docentes eram nomeados pelo poder político central, com o intuito de promover uma maior disseminação das ideologias oligárquicas e não, de fato, de engrandecer o ambiente acadêmico.
Para agravar o problema, havia uma carência enorme de pessoas qualificadas para exercer os cargos de professores de universidades. A elite letrada, com formação portuguesa, procurava se empregar em cargos dentro do próprio governo, ou levavam uma vida política, o que fazia com que faltasse pessoal e ainda mais, pessoal qualificado. Com a falta de acadêmicos, os alunos deixavam de ir às classes, o que levou as autoridades a promulgarem o Decreto n° 43 de 19 de Agosto de 1837, permitindo a aprovação de alunos que estivessem com o número de faltas maior do que o máximo permitido.
A ausência de uma maior variedade de cursos e instituições gerava uma desvalorização e um grande desinteresse e indisciplina por parte dos alunos dos cursos jurídicos. Somando-se a isso, a falta de profissionais qualificados para os cargos de docentes, como citado acima, desestimulava a frequência dos alunos nas aulas.
A intervenção estatal nas universidades procurava amenizar os conflitos com os alunos por meio de diversos decretos. Como por exemplo, a decisão n° 384, de 18 de novembro de 1831, expressa a necessidade de controlar a insubordinação dos alunos, sugerindo, inclusive, medidas penais para conter os abusos estudantis contra os docentes.
A intervenção estatal nas universidades se dava com o objetivo de assegurar o treinamento da elite a homogeneidade do pensamento. Escolhendo e nomeando docentes, o Estado facilitava os vínculos entre os acadêmicos para que estes concordassem com as posições ideológicas adotadas e difundissem com maior facilidade o pensamento da oligarquia.
Além disso, programas e manuais deveriam ser aprovados pelo próprio parlamento para que houvesse a certeza de que o conteúdo disseminado era o conteúdo que favorecia o estado e consequentemente as elites políticas. Os valores transmitidos pelo ensino deveriam ser liberais, como bem explica Tércio Sampaio Ferraz Júnior:
Os cursos jurídicos no Brasil, em sua gênese, manifestavam uma mentalidade reativa, constituída pela pregação do individualismo na organização política dos Estados e pelo liberalismo nas relações econômicas.
Muitas dessas intervenções estatais em forma de decretos vinham com a justificativa de contenção da indisciplina dos estudantes, que como sabemos, era frequente. Porém, também poderiam servir para conter manifestações críticas quanto tipo de ensino e ideologia propagados na universidade.
Tendo em vista os problemas apresentados, diversos alunos obtinham sua aprovação sem mérito. Alguns docentes, em função de sua pouca qualificação, aprovavam alunos desrespeitando os estatutos das universidades. Outro fato que contribuía para esse fenômeno era a possibilidade de altas taxas de reprovação se os estatutos fossem respeitados, devido o desinteresse dos estudantes para com os estudos. Somando-se a isso, os docentes frequentemente corrigiam as avaliações com considerável desleixo, atribuindo notas mais altas do que as merecidas para os estudantes.
Houve tentativas para abrandar a falta de meritocracia, como a formulação decisão n° 229 de 5 de agosto de 1831, na qual o Imperador ordena que os professores respeitem o estatuto e atribuam as notas de acordo com o sistema meritocrático. Outra decisão nesse sentido foi a decisão n° 404, de 17 de dezembro de 1832, que versa justamente sobre esse desleixo dos professores na correção das avaliações, o que preocupava o governo central, uma vez que essa conduta poderia gerar descrédito para as universidade e a desvalorização dos bacharéis formados.
Em suma, o aprendizado jurídico no Brasil não conseguiu formar, com eficácia, discípulos, como havia sido proposto, não promoveu o engajamento dentro da academia (tanto de alunos como de professores) e apresentava sérios problemas ideológicos, uma vez que se propagava apenas um tipo de pensamento manipulado.
A grande preocupação era a de formar um bacharel político treinado e não juristas críticos e preparados, capazes de dar sentido ao sistema jurídico do país. Apesar de todos os problemas da academia, o império atingiu seu objetivo máximo que era o de criar uma massa dominada de mão de obra para o aparato estatal e para que fosse mantida a ordem das coisas.
Felizmente, a análise da história nesses termos nos permite compreender os problemas que ocorreram para que haja um pensamento crítico e progressista com relação ao futuro. Aos poucos, a academia e os intelectuais brasileiros vão se libertando das correntes de interesses exteriores, mesmo em uma realidade na qual sempre haverá escravidão ideológica, para produzirem um conhecimento a serviço não de interesses dominantes, mas do crescimento do país e da melhoria da qualidade vida da população.
IV. O Direito, os juízes e os antigos processos bíblicos
Um dos Livros que compõe a Bíblia é o de Juízes.
O Livro de Juízes está no Velho Testamento, contém 21 capítulos e foi escrito por volta de 1.050 e 1.000 a.C. Contudo não se sabe ao certo quem é o seu autor, apesar de muitos acreditarem ser o profeta Samuel.
Mas, por que este livro tem esse nome?
Bem, o livro de Juízes conta a história do tempo dos Juízes de Israel.
Esse tempo começa com a entrada do povo na terra de Canaã (terra prometida) no final da vida de Josué, até que se constituí sobre Israel o primeiro rei que foi Saul (nesse tempo o povo de Israel começou a pedir um rei e Deus designou Saul).
Como Israel não tinha rei, os juízes atuavam como lideres do povo. Num resumo, os juízes foram os primeiros “libertadores” do povo Israelita liderando as conquistas e defendendo a terra prometida contra os seus inimigos, os Amonitas, Midianitas, Filisteus, Cananeus..
O direito e os juízes bíblicos
Direito é o objeto próprio da justiça, que obriga a dar a cada um o que lhe é devido, ou seja, aquilo a que ele tem direito. Já dizia Ulpiano (150 a 228):
Assim, justiça é a vontade firme e constante de respeitar todos os direitos e de cumprir todos os deveres ou, no dizer de Tomás de Aquino, habitus secumdum quem aliquis [...] ius suum unicuique tribuit (S.th. II-II 58, 1).
Não existe um único termo hebraico para expressar essa nossa idéia de justiça; o seu significado está contido nos conceitos de juízo e retidão.
O significado básico do vocábulo talvez apareça melhor quando é aplicado a pesos e medidas (Dt 25, 15; Lv 19, 36; Jó 31, 6; Ez 45, 10); um peso “justo” é aquele que o é quando se supõe que seja. Um caminho certo leva a uma direção correta (Sl 23, 3); sacrifícios corretos são aqueles que são oferecidos de acordo com as prescrições cultuais (Dt 33, 19; Sl 4, 6; 51, 21). O rebento justo que Iahweh suscita para Davi é provavelmente um rebento legítimo (Jr 23, 5).
A Constituição Federal (arts. 92 a 95) traz as normas referentes aos órgãos do Poder Judiciário e os princípios para o ingresso e promoção na carreira da magistratura.
Como eram feitos os juízes de antigamente?
O livro dos juízes (Jz) cobre o período da história israelita que vai do estabelecimento de Israel em Canaã até o surgimento da monarquia.
Sua história é narrada na parte central (2, 6-16,31). Existem os juízes “maiores” – Otoniel, Aod, Barac (e Débora), Gedeão, Jefté e Sansão –, cujos atos são contados de um modo mais ou menos pormenorizado, e seis juízes “menores” – Samgar (3, 31), Tola e Jair (10, 1-5), Abesã, Elon e Abdon (12, 8-15) –, que são recordados apenas brevemente.
No livro (Jz), os israelitas aparecem como uma simples reunião de tribos, vivendo em aldeias, sem unidade política e praticando uma agricultura sedentária. Não demonstram qualquer sinal de unidade além do constituído por um sentido tribal e pelo culto a Iahweh.
O livro (Jz) mostra dois temas: o das histórias separadas e o da redação que está no Deuteronômio.
O tema das histórias separadas é a libertação, por parte de Iahweh, através de um “juiz”. A sua função não é tanto a de determinar a justiça segundo a lei, mas sim a de restaurar a justiça; assim, o seu papel é o de difundir o direito da parte ofendida e vingá-lo.
Ele é concebido como um líder carismático. O seu carisma está explícito em 6, 34, 11, 29, 14, 6-19 e 15, 14. É o espírito de Iahweh, concebido como espírito sobrenatural, que leva a fazer ou dizer coisas que estão além da capacidade humana comum.
Pactos na compra e venda romana
Evolução dos direitos fundamentais
História do ensino jurídico no Brasil
Comunicação de prisão ao juiz competente
Tribunal de Nuremberg: caráter de exceção e princípio da legalidade
A dispensação dos juízes na Bíblia
O direito e os juízes bíblicos
Juízo é o foro ou tribunal em que se julgam e sentenciam pleitos, litígios e demandas e em que se administra justiça. Jurisdição é juris dictio,“dizer o direito”, a função ou atividade desenvolvida pelos juízes de direito, investidos pelo Estado no poder de julgar.
Foi sempre assim com os antigos juízes?
O hebraico não possui uma palavra única para expressar o nosso conceito de justiça. O que isso representa para nós está compreendido nas idéias de “juízo” e “retidão”.
Juízo, mishpat, é o que é pronunciado por um juiz, shofet. O juízo não consiste somente na declaração por parte do juiz. Quem tem um mishpat, uma causa ou petição (Jó 13, 18) apresenta-o ao juiz. Quem tem um mishpat é çadiq, reto. Mas a pessoa não é plenamente reta – nem o mishpat é realizado – enquanto não ocorre a declaração do juiz: o mishpat deve portanto ser reconhecido.
Mas o mishpat também pode ser roubado ou “simulado”, e o juiz pode privar alguém do seu mishpat; mas se o faz, ele falta à sua missão essencial, a de conceder o mishpat.
O nosso termo mais próximo a mishpat é a “justiça”, concebida em concreto, não em abstrato. Assim, mishpat é também um direito, uma reivindicação jurídica (Jr 32, 8) anterior ao “juízo” e que é plenamente estabelecida por ele.
O juiz é assim um defensor do direito, um vingador. Como declaração judiciária, o mishpat estabelece um precedente, aproximando-se do significado de “lei”. Em um sentido mais fraco, significa “procedimento”: o mishpat de um deus (2Rs 17, 26s) é o justo modo de adorá-lo no culto ritual.
O mishpat do rei (1Sm 8, 9-11) a que acena Samuel é o direito do rei, a exigência do rei ou simplesmente o modo de agir do rei. O juízo aponta em duas direções: a libertação do justo, isto é, daquele que recebe o seu mishpat, e o castigo do culpado (1Rs 8, 32). Assim, o termo também é usado com o significado de punição, mas esse uso é menos freqüente.
O juízo era exercido pelo rei (1Sm 8, 5; 2Sm 8, 5; 2Sm 8, 15): o rei representava a corte suprema, mas em teoria ouvia a causa de quem quer que lhe dirigisse sua petição (2Sm 12, 1-6; 14, 4-11; 1Rs 3, 9.16-28; 2Rs 8, 3). Absalão justifica a sua revolta afirmando que Davi não cumpria mais a sua função de juiz do povo (2Sm 15, 4).
Uma das salas públicas de Salomão era o “pórtico do julgamento” (1Rs 7, 7), onde, ao que parece, o rei ouvia os pleitos. A justiça era uma das atribuições do rei ideal (Is 9, 6; Sl 72, 1-2). Antes da instalação da monarquia, a justiça era exercida por juízes cuja instituição era atribuída a Moisés (Ex 18, 13-26).
Concretamente, esses juízes eram em geral os anciãos do clã, da tribo ou da cidade. Em termos de funções distintas, os juízes são mencionados em Dt 16, 18-20; nas cidades e nas aldeias, os funcionários reais também exerciam indubitavelmente as funções judiciárias.
A reforma judiciária atribuída a Josafá em 2Cr 19, 4-11 foi realizada com a instituição de juízes nomeados pelo rei. Até certo ponto, os sacerdotes também exerciam funções judiciárias, mas é difícil determinar com exatidão o seu poder. Eles certamente detinham o poder judiciário em causas relativas à lei do culto, mas não é impossível que, no antigo Israel, a justiça tenha sido exercida junto aos santuários (1Sm 7, 16; 8, 2).
O caráter religioso da lei israelita deve ter dado aos sacerdotes um poder maior do que imaginamos e também maior do que o poder que detinham em outros povos do antigo Oriente Médio; o poder dos sacerdotes deve ter diminuído com a monarquia, quando todas as instituições israelitas foram um tanto secularizadas.
Nas histórias de Gedeão (6, 11-23) e de Sansão (13, 2-23), tal assunto foi ressaltado como o relato de uma vocação.
O termo “juiz” é usado no sentido de governante ou chefe. É usado nesse sentido a propósito de Moab em Am 2,3 e reaparece nos títulos atribuídos aos governantes de Cartago, colônia fenícia. Os juízes menores eram provavelmente simples chefes de tribos, aos quais o compilador deu depois o título de “juiz”.
O critério usado no Deuteronômio organiza as histórias em um ciclo de pecado, castigo, arrependimento e libertação.
As invasões estrangeiras são enviadas por Iahweh como castigo para o pecado, particularmente por causa de cultos aos deuses cananeus; quando os israelitas se arrependem de seus erros, o libertador põe um fim à punição. Esse tema aparece na introdução (2, 6-3, 6) e nas fórmulas do Deuteronômio que enquadram as histórias (3, 7s. 11s; 4, 1; 6,1; 10, 6-16; 13, 1).
Essas modificações nas histórias antigas expressam a profunda convicção israelita de que o mal é sempre seguido de outro mal, ao passo que quem faz o bem recebe o bem.
A crença no líder carismático como garantia suficiente da segurança de Israel, em virtude das promessas de Iahweh, sem dúvida fazia parte da fé daqueles israelitas para os quais a realeza humana não podia deixar de ser uma violação à realeza de Iahweh.
O livro (Jz) ensinava aos israelitas que a opressão é castigo da impiedade e que a vítima é conseqüência do retorno a Deus. O Eclesiástico louva os juízes por sua fidelidade (Eclo 46, 11-12) e a carta aos hebreus apresenta seus êxitos como a recompensa de sua fé; eles fazem parte daquela “nuvem de testemunhas” que encoraja o cristão a rejeitar o pecado e a suportar com valentia a provação a que é submetido (Hb 11, 32-34; 12, 1).
Juízo é o foro ou tribunal em que se julgam e sentenciam pleitos, litígios e demandas e em que se administra justiça. Jurisdição é juris dictio, “dizer o direito”, a função ou atividade desenvolvida pelos juízes de direito, investidos pelo Estado no poder de julgar.
Foi sempre assim com os antigos juízes?
O hebraico não possui uma palavra única para expressar o nosso conceito de justiça. O que isso representa para nós está compreendido nas idéias de “juízo” e “retidão”.
Juízo, mishpat, é o que é pronunciado por um juiz, shofet. O juízo não consiste somente na declaração por parte do juiz. Quem tem um mishpat, uma causa ou petição (Jó 13, 18) apresenta-o ao juiz. Quem tem um mishpat é çadiq, reto. Mas a pessoa não é plenamente reta – nem o mishpat é realizado – enquanto não ocorre a declaração do juiz: o mishpat deve portanto ser reconhecido.
Mas o mishpat também pode ser roubado ou “simulado”, e o juiz pode privar alguém do seu mishpat; mas se o faz, ele falta à sua missão essencial, a de conceder o mishpat.
O nosso termo mais próximo a mishpat é a “justiça”, concebida em concreto, não em abstrato. Assim, mishpat é também um direito, uma reivindicação jurídica (Jr 32, 8) anterior ao “juízo” e que é plenamente estabelecida por ele.
O juiz é assim um defensor do direito, um vingador. Como declaração judiciária, o mishpat estabelece um precedente, aproximando-se do significado de “lei”. Em um sentido mais fraco, significa “procedimento”: o mishpat de um deus (2Rs 17, 26s) é o justo modo de adorá-lo no culto ritual.
O mishpat do rei (1Sm 8, 9-11) a que acena Samuel é o direito do rei, a exigência do rei ou simplesmente o modo de agir do rei. O juízo aponta em duas direções: a libertação do justo, isto é, daquele que recebe o seu mishpat, e o castigo do culpado (1Rs 8, 32). Assim, o termo também é usado com o significado de punição, mas esse uso é menos freqüente.
O juízo era exercido pelo rei (1Sm 8, 5; 2Sm 8, 5; 2Sm 8, 15): o rei representava a corte suprema, mas em teoria ouvia a causa de quem quer que lhe dirigisse sua petição (2Sm 12, 1-6; 14, 4-11; 1Rs 3, 9.16-28; 2Rs 8, 3). Absalão justifica a sua revolta afirmando que Davi não cumpria mais a sua função de juiz do povo (2Sm 15, 4).
Uma das salas públicas de Salomão era o “pórtico do julgamento” (1Rs 7, 7), onde, ao que parece, o rei ouvia os pleitos. A justiça era uma das atribuições do rei ideal (Is 9, 6; Sl 72, 1-2). Antes da instalação da monarquia, a justiça era exercida por juízes cuja instituição era atribuída a Moisés (Ex 18, 13-26).
Concretamente, esses juízes eram em geral os anciãos do clã, da tribo ou da cidade. Em termos de funções distintas, os juízes são mencionados em Dt 16, 18-20; nas cidades e nas aldeias, os funcionários reais também exerciam indubitavelmente as funções judiciárias.
A reforma judiciária atribuída a Josafá em 2Cr 19, 4-11 foi realizada com a instituição de juízes nomeados pelo rei. Até certo ponto, os sacerdotes também exerciam funções judiciárias, mas é difícil determinar com exatidão o seu poder. Eles certamente detinham o poder judiciário em causas relativas à lei do culto, mas não é impossível que, no antigo Israel, a justiça tenha sido exercida junto aos santuários (1Sm 7, 16; 8, 2).
O caráter religioso da lei israelita deve ter dado aos sacerdotes um poder maior do que imaginamos e também maior do que o poder que detinham em outros povos do antigo Oriente Médio; o poder dos sacerdotes deve ter diminuído com a monarquia, quando todas as instituições israelitas foram um tanto secularizadas.
V. O direito e os antigos processos bíblicos
Vários processos judiciários podem ser vistos no Antigo Testamento: a aquisição do campo de Hebron por parte de Abraão (Gn 23); a transferência dos direitos do levirato a Booz (Rt 4); o juízo pronunciado por Davi sobre o caso simulado apresentado por Natã (2Sm 12, 1-6) e também sobre o caso simulado da mulher de Técua (2Sm 14, 4-11); o julgamento pronunciado por Salomão no caso das duas mulheres (1Rs 3, 16-27); o processo de Nabot (1Rs 21, 13-14). O processo descrito de modo mais detalhado é o que se conclui com a absolvição de Jeremias (Jr 26, 7-19).
Segundo a lei do Deuteronômio, são exigidos e suficientes duas ou três testemunhas (Dt 17, 6; 19, 5); o falso testemunho é punido severamente (Dt 19, 18-19), infligindo-se à testemunha falsa o castigo previsto para o crime falsamente denunciado. Os juízes também podem testemunhar. Embora o caso de Técua demonstre a existência de um direito de recurso da decisão, na maior parte dos casos a sentença era cumprida imediatamente.
Não se têm provas da existência de advogados: acusado e acusador deviam apresentar suas próprias razões. O processo geralmente era realizado nas portas da cidade: os juízes ficavam sentados, os litigantes ficavam de pé.
A Palestina do Novo Testamento era administrada segundo as leis romanas; entretanto, a administração romana geralmente deixava em vigor a lei local na medida do possível.
Pouco sabemos sobre a administração local da lei na Palestina. A função do juiz era exercida por anciãos locais e por oficiais romanos. A corte suprema do judaísmo e da Judéia era o Sinédrio. Entretanto, a sentença de morte só podia ser pronunciada pelo governador ou legado romano. Esse foi um elemento determinante no processo de Jesus diante do Sinédrio.
Além do processo de Jesus, o Novo Testamento só descreve as audiências de Pedro e João (At 4-21; 5, 26-40) e de Estevão diante do Sinédrio (At 7, 12-56). Evidentemente, o último desses processos ocorreu em uma época em que as autoridades romanas não faziam questão de seu monopólio sobre o direito de condenação à morte.
Paulo e Silas foram condenados sumariamente sob a acusação de incitarem uma revolta em Filipos (At 16, 20-22). Esse tratamento sumário não podia ser aplicado a um cidadão romano, que tinha direito a um processo; assim, quando Paulo menciona sua cidadania romana, os magistrados ficam alarmados (At 16, 36-39).
Galião recusou-se a aceitar uma acusação contra Paulo em Corinto (At 18, 12-17). Paulo recorreu novamente à sua cidadania romana em Jerusalém para fugir a uma flagelação sumária (At 22, 24-29).
Assim, subtraiu-se à justiça do Sinédrio, e sua causa foi levada ao governador da Síria (At 23, 26-30). Os judeus encarregaram um advogado de realizar a sua defesa, mas a de Paulo foi feita por ele mesmo (At 24, 1-22).
Quando a causa foi novamente levada perante Festo, Paulo concluiu o procedimento recorrendo a César, recurso que estava em seu direito como cidadão romano (At 25, 1-12).
Fontes
BRASIL. Código de Processo Civil. Lei Federal 5.869 de 11 de janeiro de 1973.
BRASIL.Constituição da República Federativa do Brasil de 05.10.1988.
BRASIL. Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Lei Complementar 35 de 14.03.1979
FUHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Processo Civil.São Paulo: Malheiros, 2007.
GRINOVER, Ada Peligrini, CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, DINAMARCO, Cândido R. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 1999.
Janio
Fonte: Artigos Gospel